segunda-feira, novembro 28, 2005

Ser ou parecer? Eis a questão.



Museu Belvedere, Viena, Áustria. Em frente a mim “O Beijo” de Gustav Klimt. Naquele momento, sem saber, entendi (ou senti) o que é a aura de uma obra de arte. E dizer isso pode parecer piegas, mas... Chorei. Penso que por alguma emoção em ver materializada a imagem tantas vezes vista em livros de arte, replicada em gravuras, multiplicada em sites e até como coadjuvante em filme de Hollywood. As pinceladas nítidas, as cores reais, as dimensões enormes ganhando um bom espaço de parede, muito maior do que eu havia imaginado. O quadro respirava, exalando seus aromas de tinta e passado.

Há alguns meses venho estudando teorias da comunicação, comunicação de massa, sociedade pós-moderna e temas afins. Modestamente e à luz das leituras de uma docente bastante versada nos temas, procuro entender as constatações (quando não as preconizações) de filósofos como Walter Benjamin, teórico da renomada Escola de Frankfurt. Em resumo (e com minhas desculpas pela forma simplista como me aproprio do conceito), Benjamin constatou que a reprodutibilidade das obras de arte possível com o advento e domínio da técnica (hoje, tecnologia), algo típico da comunicação de massa, das sociedades modernas (agora, pós-modernas), ao mesmo tempo em que permite ao homem se “aproximar” da arte, das obras e de seus autores, faz com que se distancie da obra original, de sua aura, isto é, de sua unicidade, se sua virtude única de conter seu tempo e espaço próprios. Em última análise, acaba por fazer com que a obra se veja substituída no imaginário coletivo por suas múltiplas reproduções. E que, ao fim, não seja mais possível distinguir a cópia do original. Toda aquela emoção ao ver a obra diante de si se perde. E para alguns passa até a não ter mais sentido, a ser “desnecessária”, já que está a cópia forjada tal e qual, mediatizada e ao alcance dos olhos.

Temo que tal teoria já se aplique às relações entre pessoas. Os indivíduos pós-modernos, imediatistas, maquiados por adereços e grifes, forjados em cópias de modelos de revistas e atores de TV, repetindo jargões, mimetizando “atitudes”. Mais fácil parecer que ser. Necessário até, alguns dizem. Receio que estejam apagando suas auras. Deixando-as tão pálidazinhas e estreitas que estão se tornando incapazes de emocionar. Ser ou parecer? Eis a questão!

quarta-feira, novembro 23, 2005

Conversa entre comadres: sobre limões e abacaxis

Dia desses, tive o prazer de almoçar na companhia de uma grande amiga. Comíamos os pratos de sempre, mas com temperos novos: o ambiente, a porcelana, rostos diferentes ao redor. Diga-se da companhia que poderia ser somente uma colega, mas que, graças a alguns traços de personalidade em comum - o incansável idealismo, sobretudo - se tornou uma AMIGA com letras maiúsculas. Eis que, conversa vai, conversa vem, como inevitavelmente acontece em prosa de duas comadres que, além dos já ditos traços de personalidade, compartilham também o mesmo título no diploma – bacharel em comunicação social com ênfase em publicidade e propaganda, em suma, “publicitária” - entram em pauta os temas trabalho e profissão. E com eles os tópicos posturas profissionais, empresas, estilos de gestão, chefes, subordinados e por aí.
Depois de citar alguns bons exemplos, alguns medianos, e outros que ao nosso ver não devem ser imitados, passamos aos sonhos e aos planos (nessa ordem) do que ambas tencionamos fazer no curto-prazo, às portas já entreabertas, àquelas em que só falta passar umas duas voltas à chave para que encerrem algo que já teve seu tempo e seu espaço. Nessa conversa, acabamos por fazer, mesmo sem palavras que o marcassem de forma explícita, um juramento, um pacto mútuo: buscaríamos espremer menos limões e descascar menos abacaxis em nossas próximas empreitadas. Daríamos mais espaço às ginásticas mentais, aos bordados e remates, às chaves de ouro ao fim de cada tarefa.

Felizmente não é regra, mas acontece com alguns bons profissionais: há casos em que se transformam nos espremedores de limão de plantão, nos descascadores oficiais de abacaxi (veja, não necessariamente o caso das interlocutoras dessa prosa!). Tudo bem que esses profissionais sejam capazes de tais proezas, de fazer a limonada mais doce já experimentada, de descascar o espinhoso fruto em tempo recorde. Mas, vejamos: vale a pena empregar tanta habilidade ou, usando o jargão dos RH, tanto talento em maior medida para os consertos do que para os acertos que possam levar a novos projetos, serviços, produtos e até a novas empresas?

A discussão naquele almoço entre amigas e colegas de profissão chegou a um diagnóstico indigesto: os espremedores-de-limão-de-plantão-e-descascadores-oficiais-de-abacaxi são, em geral, muito competentes, chegam sempre a uma ou outra solução apropriada, ao final sempre servem a limonada ao superior e aos demais colegas. Mas nem sempre tem o devido reconhecimento. Claro está que para tais feitos são comprometidos com seu trabalho. Claro está também que têm de sobra o chamado jogo de cintura, característica bastante valorizada por muitos empregadores. Entretanto, ao fim, como somente espremem limões e descascam abacaxis, são com alguma freqüência intencionalmente rotulados e profanados como “quem só faz isso”, “só é capaz disso” e não de empreender e produzir também. E nesse papel “menor” acabam por não alcançar a recompensa pleiteada, isto é, remuneração justa, reconhecimento e perspectivas de crescimento. Aqui, gostaria de fazer uma referência ao texto que acabo de ler no blog “Arguta Café” (arguta.blogspot.com), publicado por um profissional a quem devoto grande admiração e a quem tenho como um bom exemplo de “bom exemplo” de profissionalismo. Empresa e funcionário devem estar quites, deve haver responsabilidade e respeito dos dois lados. Deve ser um bom negócio já que, no fundo, é um negócio. E, como já se diz há tempos, bons negociantes (no melhor sentido do que é “ser bom” no que se faz), no fim das contas, chegam ao famoso “ganha-ganha”, ganha a empresa, ganha o funcionário. Se isso não existir, se um dos pratos da balança estiver pendendo mais que o outro, é razoável rever a relação. Os dois lados em hora ou outra terão que espremer limões (e quantos!). Mas que sejam distribuidos e que a limonada seja saboreada por todos. E que haja espaço equivalente para empreender e produzir. Sempre. Pois me parece ser da natureza do bom profissional querer colocar sua marca sobretudo em feitos, em realizações. E da natureza das empresas preocupadas em manter seus talentos e seu capital humano valorizar essa motivação natural. Moral da história: procure sempre mostrar que é capaz de mais do que lidar com limões e abacaxis!

segunda-feira, novembro 21, 2005

Balzac e Saramago: dos 30 aos 80. Ou dos 80 aos 30.

Para inaugurar esse blog, falo do livro que acabo de devorar: As Intermitências da Morte, do Saramago, esse senhor português admirável. Mais do que a narrativa fantástica da obra, sobre as vontades e desejos da morte como ente que determina o fim de nossa viagem por aqui, nossa única e indesejada certeza, o que sempre me toca ao terminar um livro desse senhor é saber que aos 80 e tantos anos ele está no auge de sua lucidez e produção literária. A poucos dias de completar meus trinta anos e passar para a fase que Balzac descreve de forma romântica em seu livro "A mulher de trinta anos" - na acepção dialética do termo romântico, do belo e do trágico que se completam e coexistem - penso que faz sentido olhar adiante e fazer um balanço dos passos até então. Não se preocupem, não o farei aqui! Isso reservo para os momentos de necessária solidão, para os últimos minutos antes de adormecer, para os primeiros ao acordar... Mas já concluo que é reconfortante e ao mesmo tempo incômodo ter um exemplo como Saramago. Concluo e ratifico uma frase feita, a que diz ser necessário aproveitar cada minuto de nossas existências. Sem achar que é possível recuperar o tempo perdido lá na frente, porque, ao contrário do que possa parecer, só é possível ser produtivo e lúcido aos 80 e tantos anos se durante toda nossa vida treinamos e convencemos nossa mente, nossos corpo e coração para isso. Se ao chegarmos lá cremos que realmente vale a pena estarmos despertos, por tudo o que fizemos, aprendemos e temos "ainda" a oferecer, a multiplicar, a dizer, a ensinar, a amar, a viver.