sexta-feira, janeiro 27, 2006

Alô, amigo!


Não sou de ouvir rádio. Em geral, prefiro o ruído das coisas. Das rodas do carro deslizando no asfalto, dos cachorros latindo em alguma casa da vizinhança, do vento assobiando sua melodia discreta. Há momentos, no entanto, em que o rádio é companhia bem-vinda. Na estrada, num dia de comemoração, em momentos em que a solidão se faz incômoda e é preciso entreter os pensamentos.

Ultimamente, mais por um dever de ofício (de publicitária) do que por qualquer outro motivo, tenho acompanhado a programação de várias rádios das cidades do interior de São Paulo por onde transito. E nesse exercício de ouvinte, algo, que deixaria professor Pasquale e todos os seus colegas de ouvidos constrangidos, tem me chocado: como falam de forma errada os locutores de algumas rádios! Aparentemente sob os pretextos de falar “a língua do povo”, de usar o linguajar acaipirado do interior e de se aproximar de sua audiência, ultrajam a gramática e chegam a se perder entre tantas concordâncias equivocadas, fazendo-se até incompreensíveis em algumas situações.

Todos cometemos nossas gafes. Isso é óbvio e saudável até. E temos o direito a tal. Eu mesma ao inaugurar esse blog me equivoquei sobre a escrita correta de “sarau”. Mas, diante de meu erro enrubeci solitariamente. E me apressei em colocar as letras certas nos lugares corretos para que outros não cometessem o mesmo deslize.

O que vejo como algo triste, no mínimo, no caso das rádios, é o fato deste “falar errado” não parecer constranger ou preocupar. O fato de ser corriqueiro. Aparenta um descaso de alguns profissionais com o papel de comunicadores e formadores de opinião que escolheram ou que lhes foi atribuído. Como esperar de um povo o bom uso da língua (que faz parte da uma boa educação) se alguns que podem (e devem) dar o exemplo não o fazem?!

Alô, amigos radialistas e locutores! Que tal mais sintonia com a nossa gramática? Maior atenção e cuidado nesse quesito. Os amigos ouvintes agradecem.

sábado, janeiro 07, 2006

Sobre o que dizem as casas

Depois de intencionais dias off-line, vivenciando integralmente a passagem de ano com todos os seus ritos e ditos, volto ao teclado para escrever sobre algo com que, mais uma vez, me deliciei durante esse tempo de visitas a casas de amigos e parentes para almoços, jantares, entrega de presentes e festas.

Não sei se acontece com muitos (gostaria de saber!), mas quando entro em uma casa sou hipnotizada pelos trecos, fotos, móveis, bibelôs e tudo que há em exposição. De forma mais que espontânea, compulsiva até, coloco-me a observar cada objeto e a maneira como estão dispostos, procurando pistas (ou corroborar o que já intuo) sobre os que vivem naquele ambiente, sobre os que atuam naquele cenário. Para mim, é quase um prazer fazê-lo! E, quando me deparo com uma coleção, sinto os olhos arderem de curiosidade. É o clímax de qualquer uma dessas explorações.

Bibelôs de viagens, entre eles os famosos sabonetinhos de hotel e sachês de fósforos, são os mais corriqueiros. Atestam aos visitantes que o dono da coleção é, obviamente, alguém viajado e, entrelinhas, abastado também (ou que, pelo menos, já teve sua época de vacas gordas!). Montes de porta-retratos enfileirados em estantes e sobre aparadores, também bastante comuns, comunicam sociabilidade. Salvo se as fotos são somente dos moradores ou, então, se predominam as de um deles. Nesse caso, o diagnóstico provável é narcisismo severo. Volumes de livros bem dispostos e com alguns indícios de uso me fazem sentir um carinho imediato pelos que vivem ali. E uma passada de olhos pelos títulos pode evidenciar mais sobre os personagens do lugar do que várias conversas. Quadros e gravuras em abundância são um deleite para um investigador de cenários domésticos: traduzem o gosto estético, indicam um estilo predominante – moderno, tradicional, irreverente, excêntrico. E, falando em excentricidade, há os que deixam claro que estão (ou pretendem estar) fora do centro, com amontoados de coisas bizarras como pequenas caveiras, carrancas, brindes de plástico expostos em cristaleiras, entre outros, que de tão estranhos acabam simpáticos.

Se isso tudo me entretém, por outro lado algo que chega a me frustrar são casas em que visivelmente é o tom de um decorador o que predomina. Muito insípidas e práticas, não conseguem contar quase nada sobre os que nela habitam. São casas sem aura e sem história aparentes. Nada contra o trabalho dos decoradores. Sou das pessoas que mais admiram sua capacidade de caracterizar um ambiente, de torná-lo mais confortável ou esteticamente agradável. O que me frustra é quando este trabalho se basta, quando o morador não participa e, pior, cultiva a impessoalidade do ambiente formatado, sem acrescentar a ele suas relíquias, suas pistas.

Frustrações à parte, sempre há casas que são verdadeiros parques de diversões, repletas de elementos lúdicos e acolhedores. E, certamente, outros observadores como eu para se deliciar com elas. Fique atento! Um deles pode caminhar porta adentro a qualquer instante.