Sexta à noite, entre uma cerveja e um petisco e vice-versa, conversava com uma querida amiga, nobre doutoranda em química pela USP, sobre um desses assuntos assíduos às mesas dos botecos. No caso, o particular e folclórico “jeitinho brasileiro”. Falávamos sobre a popular prática do “valor a mais” na nota fiscal, entre outras assemelhadas. Para evitar controvérsias, já de início declaro meu veredicto sobre tais práticas: injustificáveis. E ponto final. Para meu alento, esta também foi a posição de minha titulada interlocutora.
Em algo, no entanto, discordamos. Sobre o valor de nosso sussurro em meio a uma multidão que, infelizmente, costuma cantar um outro refrão. Segundo me disse e a seu ver, nosso caxiismo nunca passará de mera opção pessoal para nos mantermos em paz com nossos implacáveis travesseiros. Sentenciou fatalista: “Minha cara, não vamos mudar as coisas, elas são o que são. Agindo assim, só dormiremos mais tranqüilas. Só e só”. Não pude discordar do fato de que, pelo menos aqui na terra dos gérsons, compartilhamos nossa “opção” com uma aparente minoria. Contudo, todavia e entretanto e apesar de todos os pesares, ainda acredito no poder contagioso das atitudes, das boas e das ruins. Na força do exemplo. E isso não é conversa de Poliana, não senhor! Basta dar um pulinho a algumas paragens no lado de cima do planeta e verificar: quando bem plantadas e adubadas regularmente as boas práticas florescem e se multiplicam. E se pensar e agir assim for piegas, defendo um surto de pieguice.
Para arrematar o discurso, recorro a uma das infalíveis citações:
“Não é a força, mas a constância dos bons sentimentos que conduz o homem à felicidade.” Friedrich Nietzsche
domingo, outubro 22, 2006
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5 comentários:
Também acredito no poder contagioso das atitudes. E essa crise de valores que vivemos atualmente demonstra como é verdadeira a sua tese sobre o contágio: as atitudes contrárias às que você prega (e eu também) estão mais frequentes e "contaminando" mais.
Já que citou Nietzsche, gostaria de completar com outra do mesmo livro: "É por nossas virtudes que somos bem punidos".
... e acho que a frase elimina qualquer traço "Poliana" do qual você parece querer fugir.
beijo agradecido pela possibilidade de reflexão
Pois é ... como disse outro dia, vivemos em tempos da ética cosmética e da indignação do sofa (diante da televisão).
Meu pai me dizia desde pequeno que acreditava no efeito multiplicador dos atos.
Rosangela, mãe de meus dois filhos e companheira de toda uma vida, me ensinou que o exemplo é mais forte que o discurso na educação dos pimpolhos.
E eu, na minha vida profissional, como subordinado, chefe ou professor, conheci o poder contaminador das atitudes.
Não sei se fiz muito ou se fiz pouco. Mas fiz o que pude, sempre com a sensação de que deveria ter feito mais, mas com a certeza de que tentei dar o melhor de mim.
Hoje, busco aceitar também o "pior", porque é isso que nos faz mais completos e capazes de viver a vida por inteiro e entender melhor pensamentos como os de Nietzsche, cuja argúcia admiro, embora não seja fã.
Caros Udi e Flávio,
Obrigada por complementar minha divagação... E por estarem sempre presentes!
Acredito que um dos grandes passos nos meus "30" esteja sendo o de aprender a conviver jeitnhos e afins. Como disse o Flávio no Arguta outro dia, focar em como lidar com o que me parece torto e não apenas questioná-lo e não agir por não saber desentortá-lo.
Em tempo, exemplos como os de vocês me inspiram, sempre.
Um beijo saudoso,
Amanda
Querida Amanda: adorei seu blog. Ele é inteligente, delicado, leve e competente. Sobre a questão "ética" levantada no boteco, sou da mesma opinião: injustificável sob todos os aspectos. Ao que vejo, suas leituras de Saramago lhe fizeram muito bem. bjs
Queridos Cá e Bedaque,
Duas gerações visitando o Sarau? Quanta honra!
Bedaque,
Acompanhei seu diário diretamente de Moscou e cidades da Espanha e me parece que se tem alguém que merece elogios aqui, este alguém é você. Ou só faço de conta, você escreve pra valer.
Um beijo carinhoso,
Amanda
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